Friday, December 14, 2007

AS COISAS POSTAS


Foto:Edivaldo de Jesus Teixeira

E pôr-se uma coisa
sobre a outra
a carne sobre ossos
e a pele
e a luz sobre o lago
e a árvore sobre a pelve
e o musgo.

E pôr-se a luva sobre a mão
do assassino
a epiderme e os sinais digitais
sobre ela postos
o segredo posto sobre o crime.

O conceito posto sobre a obra,
seus desígnios insondáveis.
O olhar do autor da obra
sobreposto à imagem ( palavra-objeto )
que a consubstancia e exprime.
O mapa posto com contornos
que o geógrafo pondera e imagina :
a fronteira da fome entre os povos
posta assim como uma sina.

E a imagem posta sobre
Santo Sudário,
em que tempo, com que perícia
as mãos a exprimiram?
Em que estábulo obscuro ou oficina,
com que escopo a teceram entre fímbrias,
com que tinta indelével e tão fina
que ainda hoje se percebe suas linhas?

A colcha posta sobre a amante
deixando entrever os seios túrgidos,
a pelve sobressaindo urgente e escura,
com que desejo se teceu tão vívida forma
dando-lhe o gosto do amor e da aventura?

E aquela maravilhosa pintura
posta no teto da Capela Sistina?
Com que louvor pintou-a Michelângelo
tecendo-a poro a poro, em que dia,
com que régua cada ângulo ele media,
cada contorno, expressão ou agonia?

E o rosto do outro posto no espelho
procurando a identidade absoluta
desse enigma,
pois postas ali estão surpreendentemente
as duas faces do mesmo paradigma.


Poema de Edivaldo de Jesus Teixeira premiado no Concurso Nacional de Poesia, promovido pela Secretaria da Cultura do Estado do Paraná em 2007.

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